Reputação em tempos de pandemia: 6 passos essenciais para uma boa gestão

A mudança de ano foi vista, simbolicamente e com relativo otimismo, como uma lufada de ar fresco de um 2020 que ficará para a História: da elevada incerteza trazida pela pandemia de Covid-19 (com reflexos em todas as dimensões do quotidiano) e maior vulnerabilidade económica global até ao exacerbar das clivagens na política interna de vários países (a que não foram indiferentes os protestos internacionais antirracismo, o ceticismo galopante contra instituições estabelecidas ou o processo eleitoral norte-americano, por exemplo). Foi também o ano em que a grande maioria dos gestores teve de repensar modelos de negócio e de trabalho, mas sobretudo refletir sobre o propósito da organização que lideram, os seus valores e a forma como se relacionam com os diferentes stakeholders. Nesta equação, é especialmente importante a relação com os colaboradores, fortemente impactada por novos procedimentos de proteção sanitária e pela disseminação do teletrabalho.

Apesar do otimismo de mudança, associado também ao início das campanhas de vacinação, janeiro de 2021 trouxe um novo confinamento, o que nos lembra de que os tempos de pandemia estão longe de ser passado. Precisamos por isso, de consolidar os ensinamentos alcançados no ano passado e, com resiliência, manter uma gestão eficaz da reputação à prova do atual contexto.

Com a experiência dos confinamentos e as restrições do primeiro semestre de 2020, as organizações (e até as famílias) aprenderam a operar em duas velocidades: do abrandamento da interação presencial à aceleração da adaptação e evolução comportamental. Olhamos hoje para os mesmos setores de atividade com outros olhos, à luz do novo contexto. A transformação digital das empresas disseminou-se e tornou-se parte do status quo de sobrevivência, com a tecnologia a perder algum do estatuto diferenciador de outrora. E a saúde passou a ser o “melhor aluno da turma” quando o assunto é reputação.

Em suma, nada está como antes no mundo da gestão da reputação. O que não é necessariamente uma má notícia. Sobretudo se tivermos em conta os seis passos que se seguem.

1. Não se pode gerir o que não se mede

Medir, monitorizar, mitigar e gerir o impacto das perceções internas e externas nos resultados do negócio nunca foi tão vital. Segundo o estudo da Weber Shandwick “The State of Corporate Reputation in 2020: Everything Matters Now”, 76% dos líderes afirmam que a reputação é responsável por assegurar mais de três quartos do valor de mercado de uma empresa. Desses, 81% acreditam que monitorizar a reputação já não é uma escolha, mas uma necessidade. Nestas empresas estão implementadas metodologia de medição contínua onde os critérios mais relevantes são a satisfação dos colaboradores e a performance financeira (ver tabela). 

2. O poder do propósito

Estima-se que atualmente a reputação do CEO tenha um peso de cerca de 50% na reputação de uma empresa. Embora a importância do líder não seja surpreendente, os motivos que hoje são considerados fundamentais para eleger o melhor CEO mudaram significativamente.

Atualmente os líderes com melhor reputação são os que estão focados em demonstrar compreensão e apoio aos colaboradores, aos clientes e à comunidade em que estão inseridos. Estas foram as conclusões de um estudo levado a cabo pela consultora britânica SRJ, que analisou mais de 2,3 milhões de dados recolhidos em conversas online sobre os CEO que integram a lista Fortune 100, entre janeiro e maio de 2020.

Um exemplo notório desta nova era em que o propósito é rei pode ser encontrado na WalMart, uma das principais redes de supermercado e lojas de retalho nos Estados Unidos, que se tornou a maior distribuidora de armas no país. O CEO da Walmart, Doug McMillon, ousou, contra todas as expectativas, retirar as armas e as munições das prateleiras (deixou de vender munições em 2019 e, em outubro de 2020, deixou de vender armas nas lojas), como uma medida preventiva, tendo em conta a “agitação social” do país. Com esta iniciativa viu a sua posição no ranking de melhor líder passar da 57.ª posição para a 17.ª, em apenas cinco meses.

3. Enfrentar as más notícias com transparência

O silêncio não é uma opção. Basta observar as consequências da estratégia de comunicação do governo chinês no que se refere à partilha de informações sobre os primeiros casos de Covid-19. Um inquérito realizado pela Pew Research Center constatou que no último semestre de 2020 houve um aumento acentuado das perceções negativas em relação a China em vários países democráticos. Na Austrália, 81% das pessoas afirmam ter uma visão desfavorável do país. Uma medida de gestão tão negativa que não poupou a reputação das empresas do país.

Outro exemplo a não seguir é o da Boeing.  A omissão de falhas no design do jato Max 737, tanto de pilotos como de reguladores, resultou na queda de dois aviões em 2018 e 2019, matando centenas pessoas. Às fatalidades soma-se uma multa de milhões de dólares aplicada pelas autoridades norte-americanas.

Em suma, a tentativa de alcançar o rival europeu Airbus saiu gorada, a empresa teve prejuízo pela primeira vez nas últimas duas décadas e, segundo o último estudo Reptrak Reputation Score, viu a sua reputação claramente lesada. De acordo com esta entidade, a Boeing foi a empresa com pior desempenho, tendo registado a maior queda dos últimos 3 anos. No mesmo período a companhia perdeu 9.35 pontos percentuais no ranking reputacional.

4.  Usar o contexto a seu favor

Em 2019, a capacidade de inovar pesava cerca de 12,8% na perceção da reputação de uma empresa, segundo o estudo Global Reputation da The RepTrak Company. Em 2020, a inovação foi capaz de operar milagres. A indústria farmacêutica, que há cerca de um ano era o setor de atividade mais “odiado” pelos norte-americanos, é hoje sinónimo de esperança, aliada ao esforço de desenvolvimento de uma vacina em tempo recorde.
Segundo um estudo do instituto Gallup, a perceção negativa que os norte-americanos tinham em relação às farmacêuticas caiu de 58% para 49%, de setembro de 2019 para o mês homólogo de 2020, com cerca de 34% dos norte-americanos a expressarem ainda uma visão positiva da indústria.

5. Valorizar a voz ativa do CEO junto das comunidades

Desde o início de março até ao final de maio de 2020, os CEO com uma postura de comunicação proactiva foram capazes de salvaguardar 260 mil milhões de dólares em valor de ações, com os títulos que representam a exibirem um desempenho cerca de 3,75% melhor do que os seus concorrentes. Segundo um estudo da FTI Consulting, publicado em julho, os CEO com maior visibilidade e que com maior frequência e informalidade contactam com os diversos stakeholders nas redes sociais têm uma maior capacidade de resiliência quando enfrentam uma crise.
A melhor parte? Ainda há pouca concorrência. Apesar de quase 50% dos CEO marcarem presença nas redes sociais, apenas um em cada quatro cria conteúdos com uma regularidade superior a um post por ano.

6. Manter a flexibilidade sem comprometer a comunicação

Criar um local de trabalho seguro e flexível nunca foi tão importante para a reputação de uma empresa. Esqueça as sedes com ginásios, máquinas de jogos e uma decoração de interiores fora da caixa. O que os colaboradores querem é flexibilidade no modelo de trabalho.

Segundo o estudo publicado no final de 2020 pela consultora Weber Shandwick, 70% dos colaboradores que estão a trabalhar a partir de casa dizem que são mais produtivos e 85% afirmam que têm todas as ferramentas que necessitam. Há mais: cerca de 63% dos trabalhadores dizem que os líderes das empresas estão mais acessíveis e 77% dizem estar mais conectados à visão e ao estilo de liderança das empresas.

Como se não bastasse, mais de 60% dos colaboradores acreditam que as mudanças no local de trabalho impulsionadas pela pandemia vão melhorar a tão ambicionada relação de equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal.

Lembre-se que, mesmo com as restrições e perturbações atuais, há oportunidades a explorar para fazer mais e, sobretudo, melhor. Monitorize e antecipe; invista nos valores e propósito da sua organização; mantenha a flexibilidade; privilegie a transparência na comunicação interna e externa e faça soar a voz ativa da sua liderança.

Estes são alguns dos trunfos para manter a motivação das suas equipas, a confiança dos consumidores e o desempenho do seu negócio neste contexto desafiante – e, com isso, melhorar a reputação da sua organização junto dos diferentes stakeholders, mesmo em tempos de pandemia.